Instruções para construir um Sonho Partilhado

Foto de Kylo, 2019, sob a licença de Unsplash.

A ideia de um Sonho Partilhado como base de um possível plano estratégico, surge da necessidade de trocar e comparar as diferentes visões individuais dos membros de uma empresa familiar. Cada um, a partir do seu próprio ponto de vista, gera perspetivas, opiniões e expectativas sobre um futuro pessoal que nem sempre coincide com as do grupo.

Os irmãos Gemini passavam por uma crise na orientação do seu negócio. Se aquando da criação da empresa a intenção era clara (um desenvolvimento profissional e económico dos proprietários Ángel e Rogelio), com o decorrer dos anos ambos satisfizeram na maioria destas primeiras necessidades. Agora estavam perante uma incerteza quanto às necessidades pessoais de cada um e de como esta afetaria a sua relação.

Rogelio pensava pouco neste tema, mas estava consciente que era necessário fazer algo. Além disso, não apreciava sentir que era sempre o irmão quem apresentava as «soluções inteligentes». Ao assistir a uma apresentação na Associação de Empresários, a que assistiu por obrigações protocolares, o apresentador chamou a sua atenção para um conceito que, até esse dia, desconhecia: o Sonho Partilhado.

– Claro!, murmurou ao dirigir-se com passos decididos à sua viatura no estacionamento. É isso. De certeza que o Ángel vai apreciar… e vou impressioná-lo!

 

Imagens e símbolos de um futuro.

Cada vez que ajudo os membros de una família a chegarem a acordo em qualquer tema, faço-o em função do futuro. A existência de qualquer regra ou norma está condicionada a que existe um amanhã comum que desejamos alcançar. O facto de pertencer a uma empresa familiar não implica que estejas condenado a estar vinculado a ela; assim, cada um deveria ter claro o caminho que tem pela frente … e se o percorrerá só ou acompanhado.

O importante no momento de planificar numa empresa familiar, é conhecer e respeitar o que pensa o outro em função dos seus desejos genuínos e, a partir de aí, construir tudo o que seja possível de forma conjunta, tendo por base o mínimo comum múltiplo das visões individuais. Analisar os aspetos em que coincidimos e aqueles em que não. Encontrar onde e como partilhamos os nossos sonhos.

Como o fazemos? Pois, a única forma é … sonhando. Cada um deve descobrir o seu próprio sonho. E como toda a atividade do subconsciente, o mundo onírico está infestado de imagens e símbolos que representam os nossos desejos, sentimentos e medos mais profundos. Se somos sinceros connosco próprios, saberemos valorizar os elementos que o nosso futuro imaginário resguarda só para nós, e quais os que se devem revelar e comungar com outros.

 

Nenhum sonho é absurdo se é autêntico.

Se existe afeto, nenhuma abertura do coração à tua família é perigosa. Partilhar, especialmente neste caso de definir o futuro, é um ato de amor. A melhor garantia para dar forma a esta ideia coletiva da imaginação, é que cada um respeite os sonhos do outro.

O primeiro passo é o autoconhecimento. Para isso cada um, separados, deverá escrever individualmente, afirmações que definam a visão do seu «eu» dentro de 10 anos: o perfil profissional, familiar, empresarial e como proprietários vinculados ao património partilhado. Para isto não é necessário pensar muito, simplesmente tentar preencher uma folha com ideias que vão surgindo sobre essa projeção pessoal do futuro.

Tendo presente estas ideias, proponho o seguinte exercício:

  • Ir ao pesquisador de imagens do Google no computador ou no telemóvel. Selecionar as fotografias e os desenhos que ali aparecem e reflitam o futuro desejado, utilizando palavras-chave do que se se escreveu. Para uma maior variedade pode-se traduzir as palavras para outro idioma, por recurso algum tradutor automático.
  • Tentar incluir as imagens que ajudem a abranger todos os aspetos da visão do futuro pessoal e da empresa familiar. Recomendo ficar com as que representem melhor os sentimentos que se geraram durante a redação da visão individual.
  • Imprimir as imagens selecionadas, recortá-las e fazer uma composição gráfica, utilizando todo o espaço necessário. Deixar que a veia artística se expresse. Se desejarem pode desenhar, acrescentar palavras, frases, fotos que se possua ou recortes de revistas que nos chamem a atenção. Pode utilizar uma estrutura para justificar a composição ou, simplesmente, colocar os elementos como melhor lhe pareça. Quando sentir que a colagem faz «click» e que tem um sentimento de satisfação com o que se vê, então aí estará. Esse é o sonho pessoal.

 

Como partilhar o sonho pessoal.

Uma vez definido o sonho, pode-se transcrever o resultado visual numa frase, por vezes numa só palavra. Assim se consegue redigir essa ilusão de uma maneira prática y se poderá recordá-la com mais facilidade.

Agora, para se chamar «sonho partilhado», deve-se contar com outros que se impliquem no mesmo exercício. Neste ponto recomendo que devem contar com uma pessoa alheia à empresa familiar, que tenha a confiança de todos os que participem no exercício, que os possa guiar, procurando harmonia e equilíbrio na participação de todos e cada um no resultado.

Se não vedes exequível ou necessário contar com esse guia externo, e sentis que podeis prosseguir por conta própria, estes são os passos seguintes:

  • Convidar a fazer o mesmo exercício da colagem pessoal, de forma separada, aquelas pessoas com quem se deveria partilhar a visão da empresa familiar. Reservar o tempo e o local para fazer o exercício. Manifestar-lhes a importância que tem e prepará-los para que a experiência esteja bem organizada. Assegurar que todos os que participaram tenham redigido as ideias do seu futuro pessoal, familiar, laboral e da empresa familiar, colocando a ênfase nesta última, e tenham selecionado um número de imagens suficientes.
  • Selecionar e acordar as que representam os pontos de coincidência e que simbolizem esse futuro imaginado, tentando englobar todos os aspetos possíveis. As imagens escolhidas serão as que simbolizem melhor o futuro desejado em conjunto. Para reforçar a mensagem pode-se fazer uma colagem coletiva, utilizando os mesmos recursos de expressão artística do sonho individual. Quando se sentir que a composição faz o «click», e que gera um sentimento de satisfação visual, então está encontrado. Esse é o vosso sonho partilhado.

 

Espiando o horizonte.

Rogelio e Ángel Gemini finalmente encontraram um espaço nas suas agendas. Foi a pedido do primeiro que se reuniram, o que não era o habitual. Ángel estava intrigado.

  • Isto do sonho partilhado — disse Rogelio, sempre muito direto —, temos que de o fazer.É importante. Teremos que encontrar o tempo de onde não o temos.
  • Parece-me muito bem, irmão!, concordou satisfeito Ángel, sentindo que ganhara uma batalha sem a combater. Sabes que temos muitas coisas para fazer, mas tens o meu apoio. Não caiamos na máxima de Mafalda: «O urgente não deixa tempo para o importante».

A pesar da colagem que conseguiram compor ter mais de caos onírico do que de plano estratégico, encontrarão 4 ou 5 pontos com que se identificavam mutuamente nesse futuro que cada um desejava, e que não tiveram a oportunidade de partilhar abertamente até então.

Foi um exercício inicial de desabafo, pensativo e divertido, que exigiria uma análise e um desenvolvimento mais profundos se quisessem transformá-lo num projeto viável. Mas começaram a falar sobre isso com uma certa coerência. Encontraram um ponto visível no horizonte que podiam olhar em conjunto. Um ponto que, curiosamente, quando o identificaram sabiam que esteve sempre lá.

Iniciaram a primeira das suas conversas ordenadas sobre o sonho que partilhavam como irmãos e sócios de um projeto comum.

 

 

Artigo de Guillermo Salazar. Sócio-gerente da Exaudi Family Business Consulting®.

 

Publicado no perfil de linkedin em 2022/05/22, reproduzido com autorização do autor e tradução de antónio nogueira da costa

 

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